Críticas ao Selo de Certificação do óleo de palma da Agropalma

Screenshot do site da Agropalma com os logotipos dos diversos "selos" concedidos à empresa O conglomerado brasileiro de óleo de palma Agropalma dispõe de 10 selos de certificação relativos à agricultura orgânica, justa e sustentável (© RdR-Screenshot) Vista aérea de um pequeno município ao longo de uma pista reta, e na parte de trás, as monoculturas Vista aérea de um pequeno município ao longo de uma pista reta, e na parte de trás, as monoculturas de palmas de óleo fincadas no meio da floresta amazônica (© Cicero Pedrosa Neto / Global Witness)

6 de abr. de 2023

“Salve a Selva” está investigando a questão do papel exercido por empresas de certificação, como a IBD, na fraude das etiquetas de óleo de palma supostamente sustentável. Essa questão tem de ser vista no contexto das acusações de roubo de terras, violência e péssimas condições de trabalho contra a Agropalma - um conglomerado de óleo de palma na Amazônia que dispõe de vários selos de certificação.

O conglomerado brasileiro de óleo de palma Agropalma é tido, globalmente, há 15 anos, como empresa-modelo do ramo. Dez diferentes selos internacionais de certificação servem como base dessa pretensão.

No entanto, entre pretensão e realidade há uma grande distância. Já por isso, nós tínhamos chamado a atenção por meio de nossa petiçãoAmazônia: Grilagem e violência por causa de óleo de palma orgânico, com comércio justo e sustentável“. Até agora, 68 mil pessoas já participaram da petição.

Reagindo a essas acusações, a certificadora brasileira IBD suspendeu um dos selos da Agropalma. Trata-se, nesse caso, do Selo da Mesa Redonda para o Óleo de Palma Sustentável (RSPO). O selo tinha sido suspenso em 08-02-2023. Isto foi confirmado, em atendimento a pedido nosso, pelo Secretariado da RSPO, em Kuala Lumpur, no último dia 30 de março.

No âmbito das investigações contra a Agropalma em decorrência da indevida apropriação de terras e falsificação de títulos imobiliários, sucede que também a IBD, a qual, segundo ela mesma, seria a maior certificadora da América Latina, acabou virando alvo das autoridades da investigação no Brasil.

“A IBD é uma empresa certificadora que serve para dar credibilidade a empresas como a Agropalma, para que elas possam vender seus produtos aos grandes mercados consumidores internacionais”, declara a Promotora de Justiça, Ione Nakamura, em uma entrevista para o coletivo de jornalistas Convoca.pe.

“O Ministério Público do Estado do Pará constatou, em sua investigação, que a certificadora IBD não considerou os critérios de proteção dos direitos humanos”, segundo Nakamura.

Entretanto, depois de muitos anos de apuração e processos, os tribunais do Brasil já anularam títulos imobiliários referentes a um total de 58.000 hectares de terra da Agropalma  – o que corresponde à mais da metade das áreas reclamadas pela empresa de oleo de dendê. Estão em tramitação outros processos, de modo que é possível que haja novas anulações, dentre elas as monoculturas de óleo de palma certificado AGROPAR, CRAI I, CRAI II e AGROPALMA. As monoculturas foram instaladas entre 1982 e 2002 na floresta amazônica situada no estado do Pará.

A Agropalma, por sua vez, continua chamando as áreas de sua propriedade - um total de 107 mil hectares na Amazônia - não reconhecendo, portanto, a fraude imobiliária já comprovada pelos tribunais. Em vez disso, a Agropalma continua, aparentemente, tentando legalizar a propriedade dos imóveis com a ajuda da autarquia estadual ITERPA. Já o Ministério Público do Pará interpôs um Agravo com Pedido de Liminar.

O Selo não tem valor legal algum

Já a anulação da certificação da RSPO da Agropalma pela IBD, que fora requerida pelo Ministério Público acabou sendo indeferida pelo tribunal, ao fundamento de que o Selo da RSPO e a certificação constituem um serviço puramente privado - desprovido de qualquer vinculação e eficácia jurídica. “O tribunal decidiu que a certificação do IBD não pode ser anulada judicialmente” - cita o portal “Convoca” as palavras da Promotora Nakamura.

A RSPO, contudo, já tinha se negado a apreciar  uma queixa em virtude dos conflitos agrários em que a Agropalma está envolvida  depois de 5 anos de tramitação, ao fundamento de que matéria de títulos de terras é de competência absoluta dos tribunais brasileiros. A Agropalma, por sua vez, qualificou a queixa como  “uma ação absurda” .

Conforme o site “Ver O Fato” , já existiriam desde a concessão do certificado à Agropalma, em 2011, críticas à certificação e pedidos de seu cancelamento à empresa certificadora IBD. Em vez de cancelar, o que a IBD ficou fazendo, até 08-02-2023, foi continuar a renovar os certificados.

As sentenças judiciais já proferidas no Brasil e os outros processos em andamento não questionam apenas o funcionamento da Agropalma, mas também todos os selos e certificados concedidos às empresas de óleo de palma. A concessão do selo tem por pressuposto, dentre outros, que a Agropalma seja a possuidora legal dos imóveis.

De modo geral, esse tipo de certificado, embora volta-e-meia seja provisoriamente suspenso por prazo determinado, frequentemente, pouco tempo depois, ele volta a vigorar. Está na cara que no processo de concessão do selo pelas certificadoras, os interesses econômicos preponderam sobre outros interesses, como a proteção aos direitos humanos, ao meio-ambiente e ao cumprimento às leis.

As certificadoras são economicamente dependentes das empresas de óleo de palma

Quem concede o Selo RSPO e verifica o cumprimento dos standards - infelizmente completamente insuficientes - é determinado pelas próprias empresas de óleo de palma. Elas podem escolher, de acordo com sua conveniência, uma empresa de um chamado pool de certificadoras acreditadas, pagando-lhes, também, diretamente, pelos seus serviços. A RSPO elenca, atualmente, 26 empresas certificadoras admitidas.

Com isso, as certificadoras são economicamente dependentes das empresas de óleo de palma. Isto enfraquece enormemente a posição delas e conduz a graves conflitos de interesses. Isso porque as certificadoras que são rígidas mal conseguem fregueses, o que faz surgir o fatal incentivo de não fazer uma verificação muito exata.

Ademais, certificadoras como a IBD conduzem as auditorias e certificações mediante aviso prévio - em locais ajustados previamente com as empresas de óleo de palma e preponderantemente, com base em informações que lhes foram disponibilizadas pelas empresas em processo de certificação.

Existe o perigo de que as certificadoras, para continuar no negócio, façam uma verificação negligente dos já insuficientes standards da RSPO. A TV pública alemã ARD explicou o problema na  reportagem "Negócios sujos da TÜV: O lado sombrio do detalhismo alemão" tomando como exemplo a certificadora alemã TÜV.

A certificadora IBD tinha sido suspendida em 2022 - sem informação sobre os motivos

Para fiscalizar o trabalho das certificadoras, a RSPO faz-se valer dos serviços de outra empresa certificadora, a saber: ASI Assurance Services International GmbH, da Alemanha. Conforme as informações da própria ASI, esta teria examinado a certificadora brasileira IBD, a qual por sua vez, concedeu o Selo RSPO para a Agropalma e, em 8 de junho de 2022 suspendeu, globalmente, a capacidade de certificação desta para fins de outorga do Selo de Óleo de Palma da RSPO. Isto só veio a ser publicado pela ASI meio ano mais tarde. Os motivos da suspensão da IBD, perante a opinião pública, são infelizmente, completamente desconhecidos, exatamente como  o reingresso da IBD em 4 de fevereiro de 2023 pela ASI.

Além do Selo da RSPO, a IBD concedeu à Agropalma cinco outros diferentes selos internacionais. Sobre a situação desses selos, não há qualquer informação. Além desses, a Agropalma dispõe de um selo emitido de acordo com os standards japoneses de agricultura orgânica (JAS) (certificadora CERES GmbH) e o selo chinês emitido de acordo com os critérios chineses (standards da FOFC) para agricultura orgânica. A certificadora suíça Bio Suisse Organic, em 2002, não prorrogou a certificação da Agropalma - igualmente sem tornar públicas as razões que o motivaram.

A “Salve a Floresta” escreveu para os 20 conglomerados que compram óleo de palma da Agropalma (ver o item “maiores informações” de nossa petição), bem como para as diferentes organizações outorgantes de selos e certificadoras para pedir esclarecimentos a esse respeito. Em breve, nós reportaremos sobre as respostas enviadas pelas empresas.


  1. alvo das autoridades da investigação

    Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) 2020. PJe - Processo Judicial Eletrônico Número: 0801353-35.2020.8.14.0015: https://www2.mppa.mp.br/data/files/EB/45/20/88/452C17107E4491F6180808FF/ACP_AGROPALMA_PORTO%20ALTO_%20FINAL%20_2_.pdf

  2. 58.000 hectares de terra da Agropalma

    Publica (2022). Com inércia do governo, empresas do dendê avançam sobre terras públicas da Amazônia: https://apublica.org/2022/08/com-inercia-do-governo-empresas-do-dende-avancam-sobre-terras-publicas-da-amazonia/

    Ver O Fato (2022). BOMBA – Acusada de grilagem e com 58 mil hectares cancelados pela justiça, Agropalma está à venda: https://ver-o-fato.com.br/bomba-acusada-de-grilagem-e-com-58-mil-hectares-cancelados-pela-justica-agropalma-esta-a-venda/

  3. outros processos, de modo que é possível que haja novas anulaçõesTribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) 2020. PJe - Processo Judicial Eletrônico Número: 0801353-35.2020.8.14.0015: https://www2.mppa.mp.br/data/files/EB/45/20/88/452C17107E4491F6180808FF/ACP_AGROPALMA_PORTO%20ALTO_%20FINAL%20_2_.pdf

  4. Agravo com Pedido de Liminar

    Ministério Público do Estado de Pará 2022. MPPA propõe Reclamação para garantir autoridade de decisão do Tribunal de Justiça. Promotoria Agrária pede a suspensão de edital de compra de terras públicas referentes às Fazendas Roda de Fogo e Castanheiras: https://www2.mppa.mp.br/noticias/mppa-propoe-reclamacao-para-garantir-autoridade-de-decisao-do-tribunal-de-justica.htm

  5. 5 anos de tramitaçãoRSPO- Grupo Recursal (2015). (2020). Re: Final decision by the Complaints Panel on the Complaint against Agropalma Group (Membership No.:1-0003-04-000-00): https://rspo.my.salesforce.com/sfc/p/#90000000YoJi/a/0o000000i0eK/nnWdyQPdKuzo1VB_MAj2Uy4TQQym.VPVmMdBP.T73gc

  6. “uma ação absurda”RSPO- Grupo Recursal (2015). Agropalma's official response to false accusations against its behalf: https://ap8.salesforce.com/sfc/p/#90000000YoJi/a/90000000PY7d/_nolTXvKwUaonrszqIXL_CbPJDXzI6NMTicNUsDd6xE

  7. Conforme o site “Ver O Fato”Ver O Fato 2023. URGENTE, EXCLUSIVO – Certificação internacional das plantações da Agropalma no Pará está suspensa: https://ver-o-fato.com.br/urgente-exclusivo-certificacao-internacional-das-plantacoes-da-agropalma-no-para-esta-suspensa/

  8. a ser publicado pela ASI meio ano mais tardeASI 2022. ASI suspends IBD Certifications Ltd. for RSPO P&C. “A suspensão ocorreu em virtude de 21.4, Tabela 1, Ponto 8 do ASI-PRO-20-101-V5.1.“ esser foi o teor do comunicado da ASI  de 14/12/2022.: https://www.asi-assurance.org/s/post/a1J5c00000UCFmHEAX/p0980

  9.  o reingresso da IBD em 4 de fevereiro de 2023 pela ASIASI 2023. Suspension lifted for IBD Certifications Ltd. for RSPO P&C accreditation: https://www.asi-assurance.org/s/post/a1J5c00000WmVqYEAV/p1056

  10. selos internacionais1. Lei que regulamenta a agricultura orgânica (Lei Federal 10.831/2003); 2. Selo orgânico da UE (Regulamento (CE) n.º 834/2007 e 2018/848); 3. US-Biolabel (National Organic Program der USDA); 4. FairTrade IBD; 5. Selo de Sustentabilidade do Grupo de Inovação do Óleo de Palma - Palm Oil Innovations Group (POIG); 6. Mesa Redonda sobre Óleo de Palma Sustentável (RSPO)

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